Podcast “Viradas no mói de coentro” discute gênero, feminismo e literatura
Projeto aprovado no edital Mulher na Ciência conta com três episódios e está disponível nas plataformas de streaming
Por Carole Ferreira da Cruz
Acaba de ser entregue à sociedade o podcast “Viradas no mói de coentro: um labafero de peito aberto sobre gênero, feminismo e literatura”. O programa de áudio online, veiculado nas plataformas de streaming, é resultado de um projeto de pesquisa aplicada aprovado no edital Mulher na Ciência (08/2019), fomentado pela Pró-Reitoria de Pesquisa e Extensão (Propex/IFS). A coordenação é da professora do Campus Estância, Jocelaine Oliveira dos Santos, em parceria com a aluna-bolsista Irla Tavares.
O objetivo é fomentar discussões sobre gênero, feminismo e literatura numa série de três episódios que trazem as vozes de convidadas especialistas nos temas abordados. A opção pelo formato podcast, que se assemelha a um programa de rádio com a vantagem de permitir à audiência ouvir quando e onde quiser, se justifica pela notável popularidade no Brasil. Dados levantados pelos aplicativos Deezer e Spotify apontam crescimento anual de 177% a 200% no consumo desse tipo de mídia no país.
Os episódios, com duração média de 30 minutos, se debruçam sobre temas atuais e pertinentes. “Nem todo homem é assim”, aborda os fios invisíveis que compõem o machismo e o patriarcado na sociedade brasileira; “Mas ele nunca me bateu”, mergulha nas diversas formas de violência contra mulher; “Feminismo é mimimi”, mostra como simplificações e reducionismos revelam tudo aquilo que dói nos outros e não dói em si mesmo, numa clara demonstração de falta de empatia.
O programa está hospedado no spotify e disponível em todas as plataformas de streaming. A distribuição vem ocorrendo por meio do whatsapp, instagram, sites e blogs específicos para que o conteúdo chegue ao maior número possível de pessoas. A intenção é que as pautas discutidas contribuam para a construção de um olhar crítico-reflexivo sobre as temáticas de gênero e feminismo num país onde a realidade de machismo e violência contra a mulher e LGBTQIA+ é uma das mais letais do mundo.
Violência e feminicídio
Relatório do Fórum Brasileiro de Segurança Pública revela que 1 a cada 4 mulheres passou por violência no ano de 2018. Os dados mostram ainda que 74,6% das vítimas apontou como autor do ato violento algum conhecido, como companheiro ou namorado, sendo que em mais de 42% dos casos a agressão ocorreu dentro da própria casa da mulher. O país teve um aumento de 7,3% no número de casos de feminicídio em 2019 em comparação com o ano anterior, segundo levantamento feito pelo G1 com base nos dados oficiais dos 26 estados e do DF.
“Por essa e outras razões incontáveis, é fundamental discutir em profundidade teorias que alicercem a compreensão sobre o ser mulher hoje e as práticas feministas, construindo um olhar crítico acerca das teorias de gênero que podem compor um mosaico de resistência frente ao machismo estrutural e estruturante da nossa sociedade. Pautas necessárias que se impõem e põem sobre a escola a premissa freiriana de que a educação existe para a liberdade”, ressaltou a professora Jocelaine.
Além do programa “Viradas no mói de coentro”, o projeto incluiu: revisão bibliográfica dos conceitos que embasaram as discussões; pesquisa na comunidade escolar via questionário e entrevista para levantar os conhecimentos sobre feminismo e teoria de gênero; planejamento, definição das pautas e das ferramentas de divulgação do podcast; e, por fim, gravação e divulgação dos episódios, coleta das impressões e percepções da audiência para a publicação de um artigo.
Combativas e aguerridas
Diante da necessidade de respeitar os protocolos de distanciamento social em meio à pandemia de Covid-19, as gravações ocorreram virtualmente pelo Google Meet. O nome escolhido para o podcast foi buscar uma expressão muito comum na linguagem popular-regional nordestina, que associa pessoas combativas e aguerridas a um molho de coentro. “Se um dia essa expressão foi usada no sentido negativo para nos oprimir, nos apontar como um problema, aqui ela é usada orgulhosamente”, revelou a professora.
O entusiasmo pelo projeto foi crescendo à medida que a bolsista Irla Tavares, do curso de Engenharia Civil do Campus Estância, se aprofundava no universo feminista. “Dentro de mim foi crescendo a vontade de conhecer mais sobre os temas escolhidos para serem debatidos, que são de grande importância e ainda desconhecidos para muitas mulheres. Estamos tendo a oportunidade de construir novos conceitos, refletir sobre a posição que a mulher ocupa na sociedade e os direitos que ainda são violados, tudo isso através da informação”, comemorou.
Quem ouviu, gostou e saiu do debate mais consciente dos danos causados pelo machismo e o patriarcado. “É importante essa retomada da discussão sobre feminismo por que é um tema que reforça a defesa dos direitos das mulheres e das classes menos favorecidas, a busca pela igualdade, o respeito aos direitos humanos. É uma forma de dar voz a quem não tem voz e fortalecer o engajamento contra esse machismo exagerado imposto pela sociedade patriarcal”, opinou Edson Carvalho dos Santos, do curso de Edificações do Campus Estância.
* Para contribuir com a pesquisa aplicada, após ouvir os episódios clique no formulário e dê sua opinião.
Confira a descrição dos episódios:
EPISÓDIO 1 – NEM TODO HOMEM É ASSIM
No episódio 01, chamamos duas viradas de carteirinha para o debate sobre os fios invisíveis que compõem o machismo e o patriarcado na sociedade brasileira e que possibilitam a propagação de frases como “Ah, mas nem todo homem é assim”, quando colocamos na roda situações de opressão, violência e misoginia. A psicóloga e psicanalista Livia Alves Ferreira, doutoranda em Psicologia pela UFF, pesquisadora das questões de gênero, corpo e feminismo, e a professora Adeline, doutora em Ciências Sociais e atenta pesquisadora sobre juventudes, já chegam mandando a letra e citando Angela Davis: "Não aceito mais as coisas que não posso mudar, estou mudando as coisas que não posso aceitar.". Nesse episódio, além dos dados e do debate fundamentado, a literatura nos ajudará a tecer importantes reflexões. Desta vez, “Hibisco Roxo”, da escritora e ativista feminista Chimamanda Ngozi Adichie foi o escolhido.
EPISÓDIO 2 - MAS ELE NUNCA ME BATEU
No episódio 02, partimos da frase “Ah, mas ele nunca me bateu” para mergulhar nas diversas formas de violência contra mulher. O que será que está por trás dessa frase? Qual a compreensão de violência contra a mulher ela guarda? Para ajudar a responder a estas e a outras perguntas, chamamos duas viradas que atuam bem pertinho da gente, em Estância/SE. Aretha Vieira Cardoso, advogada, representante da Comissão de Defesa do Direito da Mulher em Estância e região centro-sul do Estado, é militante das causas femininas e direito da mulher, e chegou lembrando que o reconhecimento da mulher enquanto ser de direitos é recente e que não podemos esquecer das feministas e suas conquistas, pois como Simone de Beauvoir diz "Ninguém nasce mulher. Torna-se mulher" e a luta faz parte desse tornar-se. Já Maria Guadalupe Batista dos Santos Lima, agente cultural e militante dos Direitos da Mulher, nos traz relatos incríveis do tempo em que atuou na linha de frente do acolhimento das mulheres vítimas de violência em Estância. O livro de Angélica Freitas, “Um útero é do tamanho de um punho” e a obra “O Papel de parede amarelo” de Charlote Perkins Gilman estão entre as nossas dicas de leitura nesse episódio.
EPISÓDIO 3 – FEMINISMO É MIMIMI
E para fechar nossa série de 3 episódios, as viradas Lorena de Castro e Isabela Goes debatem sobre a frase “Ah, feminismo é mimimi” tão propagada na internet e em outros espaços atuais. O que será que essa frase, dita e repetida na mídia e nas redes sociais, fala da nossa compreensão sobre os movimentos de lutas por direito? Por que ela segue na boca de muita gente que deseja deslegitimar e até ofender mulheres de luta? Para Lorena, bela, desbocada (quando necessário) e acadêmica, “‘mimimi’ é tudo aquilo que dói nos outros e não dói em você. Entendendo a experiência do outro nos capacitamos em compreender e colaborar com a luta dos movimentos ao invés de julgar e reproduzir de forma viciosa preconceitos e discursos arraigados socialmente.” Para Isabela, que atuou em movimentos sociais como Círculo Palmarino e Rosas de Marços, os feminismos nos ajudam a pensar num mundo melhor pra todo mundo e só a luta e o debate fundamentado podem ajudar nesse processos. Mais uma vez, recorremos à literatura e trazemos várias dicas de leitura. Cola seu ouvido nesse último episódio e vamos juntos debater com fundamento.
FICHA TÉCNICA:
Roteirização: Jocelaine Oliveira e Irla Tavares
Captação de áudio pelo Google Meet
Edição: Hector
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