Projeto Ecotech mapeia trilha em trecho de praia deserta no Abaís
Alunos e professores fazem visita de reconhecimento à região e aprendem sobre fauna, flora e uso medicinal da vegetação de restinga
*Por Carole Ferreira da Cruz
Campos floridos de um amarelo vibrante em meio a coqueirais, pés de mangaba e caju, dunas de areias claras e o mar a perder de vista são alguns dos atrativos da Trilha do Abaís, um trecho de praia deserta localizada no povoado Riboleirinha, litoral sul do estado. Essa e mais outras dezenas de trilhas estão sendo identificadas e mapeadas pelo projeto “Ecotech: ecoturismo com assistência tecnológica” do Instituto Federal de Sergipe (IFS) – Campus Estância, com o apoio de comunidades tradicionais.
A equipe do projeto, coordenado pela professora de Geografia Márcia Maria de Jesus Santos, fez uma visita de reconhecimento ao local no último sábado, dia 26, acompanhada de 43 alunos dos cursos técnicos integrados, de vários professores e servidores e do líder comunitário José dos Passos Santos, conhecido como Muniz. O passeio possibilitou um rico aprendizado sobre a fauna, a flora, a cultura e a história oral da região, além do uso medicinal da vegetação de restinga, ecossistema que ocorre na costa brasileira.
Enquanto contemplavam a paisagem, os alunos ouviam atentamente às explicações de Muniz sobre a Oroba, um coquinho semelhante ao ouricuri – também chamado de dicori ou uricuri -, que libera um líquido usado como colírio para limpar a visão e tem uma casca comestível com um gosto semelhante ao caqui. Outras plantas medicinais que chamaram a atenção dos trilheiros foram sete cascas, pião-roxo, carqueja e aroeira, úteis para tratar de inflamações, infecções microbianas, problemas do trato urinário e digestivo, diarreias, gripes, tosses, bronquite etc..
Árvores de madeiras nobres, como a maçaranduba, pés de jiló e até mandacarus ornavam o cenário dominado por plantas nativas que há gerações são usadas pela comunidade para o extrativismo vegetal. “É uma satisfação enorme, um orgulho para mim, fazer parte desse projeto e trazer esses jovens para conhecer o lugar onde nasci e me criei. Tenho certeza que unidos vamos preservar essa região para que nossos filhos e netos possam dar continuidade ao trabalho que fazemos aqui”, afirmou Muniz.
Além da preservação ambiental e do reconhecimento das tradições locais, a comunidade luta para ter voz nos processos de ocupação territorial e para garantir a sua sobrevivência por meio do extrativismo e da pecuária. Entre as principais reivindicações está o impedimento que a antiga estrada Real, que liga o povoado Riboleirinha à Rodovia SE-470, seja privatizada pelos proprietários de terra que estão repovoando a área. Garantir a livre circulação na estrada também é fundamental para viabilizar o potencial ecoturístico da região.
O ponto alto do passeio foi a chegada à praia. A extensa faixa de areia foi um convite para que os estudantes jogassem futebol, vôlei, frescobol e se refrescassem após 2,5 km de caminhada. O momento de integração contou ainda com um piquenique, partilhas sobre a experiência de trilhar e o recolhimento do lixo encontrado pelo caminho. “Foi muito especial esse contato com a natureza, conhecer outras pessoas e culturas. Aprender com diversão é bom demais. Nunca tinha feito uma trilha antes e adorei”, destacou Raquel Silva de Jesus, 16 anos, do curso integrado de Sistemas de Energias Renováveis.
A colega de turma, Kemilly Soraia, 16 anos, ficou surpresa ao perceber que não ficou cansada, mas sim renovada ao final da trilha, que tem cerca de 4,5 km. “Achei muito legal: as belezas naturais, as florzinhas amarelas no meio dos coqueiros, tudo que aprendi sobre as plantas, as frutinhas que achamos pelo caminho. Eu sou sedentária e imaginei que teria dificuldade de concluir o percurso. Pelo contrário, renovei as energias e até me animei a praticar alguma atividade física e de fazer outras atividades na natureza”, relatou.
Para o professor de Sociologia, Horimo Medeiros, o projeto Ecotech é uma valiosa oportunidade para que o IFS use os conhecimentos que produz para contribuir com a sociedade e o desenvolvimento sustentável. “Tenho dito sempre aos meus alunos a importância do ensino aliado à pesquisa e a extensão. Estar perto, saber dos dramas e do potencial das comunidades tradicionais nos fortalece enquanto instituição que usa a educação com ferramenta de transformação social. É possível preservar o Abaís e garantir que todos usufruam desse patrimônio natural”, ressaltou.
Sobre o Ecotech
O projeto Ecotech é um desdobramento da pesquisa de pós-doutorado da professora Márcia Santos e busca criar trilhas ecológicas no litoral Sul que possibilitem a aproximação com a natureza e o fortalecimento do comprometimento ambiental a partir da integração entre escola, sociedade e poder público. Os roteiros usarão as tecnologias digitais pra criar QR codes com informações sobre os diferentes aspectos socioambientais que caracterizam o ecossistema, distribuídos junto às placas sinalizadoras ao longo das trajetórias das trilhas construídas e percorridas.
Além disso, será desenvolvido um aplicativo que possibilitará um tour virtual para os visitantes interessados em educação ambiental e no ecoturismo da região. As atividades serão realizadas em parceria com as secretarias de Educação, Turismo e Meio Ambiente de Estância. Até o momento, já foram mapeadas trilhas na Praia das Dunas, na Ponta do Saco e agora na Praia do Abaís, que têm o objetivo de contribuir para a prática da educação ambiental, a aprendizagem ao ar livre (outdoor learning) e o fomento do turismo de base comunitária.
A aproximação com o lugar mapeado é de extrema importância para gerar o pertencimento e o comprometimento socioambiental. “O município de Estância tem um grande potencial socioambiental e ter a oportunidade de inserir práticas educativas que valorizem ainda mais essas áreas é um resultado muito gratificante enquanto professora e pesquisadora, além de vivenciar a alegria e o aprendizado dos estudantes que participaram da trilha”, destacou Márcia Santos.
O Ecotech atua em parceria com o projeto “Berçário de plantas com irrigação automatizada e assistida remotamente”, coordenado pelo professor Roberto da Silva Macena com o objetivo de produzir mudas com a ajuda das tecnologias digitais. As propostas, aprovadas nos editais de fomento à pesquisa e extensão, contribuem para o fortalecimento das atividades de educação ambiental desenvolvidas por professores e alunos do Campus Estância desde 2018 e convergem com o compromisso social da instituição.
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